A minha avó pergunta-me se já tenho “leituras de Verão”. Respondo-lhe que sim, embora não saiba muito bem se vou conseguir ler alguma delas, porque, para uma mãe de dois, as leituras não conhecem estação. Ou seja, é sempre possível, para não dizer provável, que não passemos da quinta linha se tentarmos ler um livro com crias por perto. E por isso é indiferente que seja Verão ou Inverno.
As minhas tentativas de leitura estivais fizeram-me pensar nestes dois livros que vagueiam cá por casa. Um, o Suplemento al Dizionario Italiano, do luminoso Bruno Munari, é uma pérola. Das verdadeiras. É uma recolha das diferentes maneiras de falar sem abrir a boca, em que os italianos são exímios, e a primeira edição data de 1963. O outro também é uma pérola, mas falsa. O mais inteligente de My Name is Charles Saatchi and I am an Artoholic são as perguntas, feitas por um batalhão de jornalistas, críticos e anónimos ao “coleccionador” de arte mais famoso do mundo. Charles Saatchi é conhecido por nunca dar entrevistas, e depois de passar os olhos por este livro, agradecemos sinceramente que nos poupe a elas. Aqui, no entanto, abriu uma excepção, mas as declarações bombásticas prometidas não são mais do que bocas sem substância. Saatchi adora dizer que nunca percebeu o esplendor de Rothko e que Basquiat o deixa basicamente frio. Também não se preocupa muito em refutar as afirmações da sua primeira mulher (e já vão cinco, mas quem é que o atura?) que diz que nunca o viu a ler um livro. E quando lhe perguntam o que tem no quarto, responde que tem a Nigella (a Watson, sua actual mulher).
E só para não ser tendenciosa, vá, vou citar uma coisa boa. Charles Saatchi é maluco por Frappucinos. Eu também.
Charles Saatchi tem má imprensa e percebe-se. Há poucos dias anunciou que ia doar parte da sua colecção ao Estado britânico, para abrir, em 2012, um Museu de Arte Contemporânea em Londres. Olhemos para a página 58 do livrinho: “I don’t buy art in order to leave a mark or to be remembered; clutching at immortality is of zero interest to anyone sane.”. Registamos.
E se Saatchi, que não gosta de ler, passasse os olhos pelo dicionário de Munari? será que aprenderia a falar sem abrir a boca? Será que aprenderia a estar calado?
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